Apesar dos avanços no acesso à educação, o Brasil continua enfrentando um grave problema: 29% da população entre 15 e 64 anos ainda é considerada analfabeta funcional. O dado foi revelado pelo mais recente levantamento do Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf), coordenado pela Ação Educativa e realizado com o apoio de instituições como Fundação Itaú, Unesco, Unicef, Instituto Unibanco e Fundação Roberto Marinho.
Estagnação no combate ao analfabetismo funcional
Segundo o estudo, o índice atual repete o cenário de 2018 e representa um retrocesso em relação a 2009, quando o percentual era de 27%. A pesquisa mostra que o país não avança de forma significativa no combate ao analfabetismo funcional há mais de uma década, evidenciando os desafios estruturais da educação brasileira.
O Inaf classifica o analfabetismo funcional em dois níveis:
- Absoluto (7%): pessoas que não conseguem ler nem mesmo palavras simples.
- Rudimentar (22%): conseguem ler e escrever, mas têm dificuldade para interpretar textos mais elaborados ou realizar operações matemáticas básicas.
Faixa etária e escolaridade preocupam
Embora a maioria dos analfabetos funcionais tenha entre 40 e 64 anos, a presença do problema entre os mais jovens também preocupa: 17% dos jovens de 15 a 29 anos estão nesse grupo. Isso evidencia que, mesmo frequentando a escola, muitos estudantes não alcançam níveis satisfatórios de letramento.
O levantamento mostra que 17% dos brasileiros que concluíram o ensino médio ainda são considerados analfabetos funcionais. Ainda mais alarmante é o dado de que 12% daqueles com diploma de ensino superior também estão nessa condição.
Desigualdades e impacto da pandemia
Ana Lima, coordenadora do estudo, destaca que a estagnação reflete a baixa qualidade do ensino oferecido no país, especialmente nas regiões periféricas. Ela ressalta que não basta garantir o acesso à escola, é essencial oferecer um ensino com conteúdo significativo e contextualizado.
A pandemia de Covid-19 agravou esse cenário, mas, segundo os pesquisadores, os problemas vão além da crise sanitária. “Temos jovens saindo da escola sem saber interpretar textos básicos ou realizar operações simples. Isso os condena a uma vida de exclusão”, afirma Ana.
Educação de Jovens e Adultos (EJA) em declínio
O estudo também chama atenção para o esvaziamento da Educação de Jovens e Adultos (EJA), apontada como uma das principais estratégias para enfrentar o analfabetismo entre adultos. No entanto, a baixa adesão e falta de investimentos têm enfraquecido essa modalidade de ensino.
Ana Lima defende a reestruturação da EJA para atender às novas demandas da sociedade, que incluem jovens que, mesmo tendo frequentado a escola, não foram plenamente alfabetizados.
Alfabetização e exclusão digital
Pela primeira vez, o Inaf avaliou o nível de alfabetização digital da população, identificando que 25% dos brasileiros entre 15 e 64 anos apresentam baixo desempenho em tarefas digitais comuns, como realizar pagamentos via Pix ou fazer cadastros em sites.
A exclusão digital é ainda maior entre os analfabetos funcionais: 95% deles não conseguem executar tarefas simples em ambientes digitais, o que os torna ainda mais vulneráveis em uma sociedade cada vez mais conectada.
“O estudo mostra que o déficit de alfabetismo tradicional compromete também a inclusão digital. Em um mundo onde serviços essenciais são oferecidos online, essas pessoas ficam para trás, muitas vezes perdendo direitos básicos”, conclui Ana.